domingo, 20 de agosto de 2017

O Lago Verde - O Final

   

  Confiando plenamente no que a moça tinha dito, ele adentrou naquele mundo tão encantador. Seguro de si, Marcos não tem a menor dúvida em segui-la. A beleza do local era tanta, que por vezes seus sentidos permitiam escapar alguma coisa. 

  Prosseguindo com a caminhada, o rapaz admirava-se com o que lhe era proporcionado. Como se não bastasse tanto deleite, de súbito, rompia-se diante dele um grande lago com uma luz dourada que pairava sobre as águas esverdeadas. O gramado que o rodeava assemelhava-se a um tapete aveludado. 

   Às margens desse lago pessoas conversavam umas com as outras. Uma parte delas passeavam às margens das águas, enquanto o restante estavam sentadas, mas todas aparentavam uma imensa felicidade em seus rostos, uma harmonia plena.

    — Está gostando do que vê? — Indagou a moça! — Contudo antes de o rapaz responder, crianças vieram até ao encontro da jovem pedindo para brincar! — A criançada gritava pelo nome dela sem parar! — Percebia-se que a moça era muito amada não apenas pelas crianças mas também pelos adultos.

    — Aqui tudo é perfeito! — Respondeu Marcos! — A perfeição está em todos os lugares, nas pessoas, nos ambientes, como se tudo fosse uma só coisa! — Completou de forma esfuziante!

    O desejo de permanecer ali envolto em tanta alegria crescia em seu coração. A decisão de não retornar para a família se consolidava dentro da mente do rapaz. Porém, a moça interrompendo seus pensamentos disse:

     — Marcos, está na hora de voltar! — Surpreso, ele tentou argumentar mas tudo foi em vão. — A jovem decidida lhe disse: — Existem pessoas que te amam, que precisam de você, por ora terá que ir, mas um dia voltarás e eu lhe mostrarei todas as maravilhas deste lugar! — Logo percebeu que eram palavras de despedida.

    Quando ela acabou de pronunciar essas palavras, uma voz familiar invade os ouvidos do rapaz, essa mesma voz foi se intensificando e tomando conta do seu ser. Ao mesmo tempo aquele mundo maravilhoso ia sumindo de seus olhos, simplesmente desaparecendo.

       — Marcos, meu filho, acorde!

     Ao abrir os olhos, ele enxerga a própria mãe à sua frente. — Dormiu pesado meu querido! — Chegou a hora de tomar o remédio novamente! — Exclamou a mãe dedicada!

     Ao ver a situação o menino sentiu um grande desapontamento. Com tudo levando a crer que fora um sonho, era como ter deixado um paraíso para trás. Todavia, em seguida, a decepção se converteu em uma consolação sem precedente, Marcos experenciava uma sensação jamais sentida, algo arrebatador.

     Dentro do seu coração nem de longe foi apenas um sonho, seu espírito sentia-se renovado. Marcos não deixara de sentir suas dores físicas e emocionais, entretanto, via-se mais fortalecido depois do ocorrido. Uma estranha convicção de que a sua vida já não era mais como antes, como se tivesse nascido outra pessoa em uma nova existência.

terça-feira, 11 de julho de 2017

O Lago Verde - Parte 4




   À medida que caminhava o temor gradualmente ia ficando para trás, mesmo que em meio àquela caminhada o menino também observava formas estranhas e sinistras ao seu redor. Esses contornos medonhos insistiam em distraí-lo, em tirá-lo de seu rumo — Não vá meu rapaz, lá não existe nada para você! — É uma perda de tempo! — Concluia a estranha figura.

   Indiferente às tentativas de convencê-lo a mudar de ideia, Marcos, continuava em frente, a passos firmes. Quanto mais se aproximava daquela luz, maior era sua alegria. Receios e inseguranças cediam espaços a uma coragem repentina e surpreendente.

   Embora a dor em seu braço persistisse, sentimentos de bem-estar passavam a reinar em sua consciência, por todo o corpo. A sensação era de que nada e ninguém o impediria de chegar até a claridade.

   Diante da determinação do garoto, as figuras horrendas o insultam duramente. Provocações variadas tinham como alvo roubar a admiração daquele jovem pela luminosidade tão magnífica, tão sublime.

   — Deixe de ser teimoso seu maldito, o que você quer encontrar nessa luz? — Não há nada de especial te esperando! — Arrematou o ser sinistro.

   Desta maneira, os xingamentos prosseguiam numa verdadeira saraivada vinda de todos os lados. Não demorou muito para que os insultos se transformassem em acusações de todos os tipos. 

   Com o aumento das agressões, os seres, cheios de ódio, tornavam-se ainda mais macabros e monstruosos. Além disso, a persistência de Marcos acirrava a irritação das criaturas ao limite, a ponto delas ficarem com os olhos tão avermelhados como se fossem pares de labaredas de fogo.

   Quando o clarão estava bem perto, um desses seres disse ao rapaz:

   — Ainda vou te pegar um dia!

   Marcos o fitou sem se intimidar diante da ameaça. Em seguida, fechou os olhos num momento de introspecção, permanecendo nesse estado por alguns segundos. Ao retornar da breve meditação todos aqueles seres maléficos haviam desaparecido. Agora o que tinha à sua frente era o brilho esplendoroso que o envolvia em um todo perfeito.

   Chegando ao local, o jovem atravessa lentamente o fulgor intenso. Aos poucos, o ambiente se convertia em uma brancura inimaginável, transmitindo uma paz profunda e consoladora. Associado a isso, o garoto experimenta uma força que o percorria da cabeça aos pés, assemelhando-se a uma corrente elétrica a qual, fazia-o estremecer por completo.

   Inteiramente extasiado, Marcos não cabia em si de tanta felicidade, mal podia crer no que estava ocorrendo. Enquanto permanecia mergulhado no êxtase ele avista uma jovem mulher vindo em sua direção, conforme ela se aproximava, mais o local se modificava. Um mundo de belezas indescritíveis se vislumbra aos seus olhos.

   Algum tempo depois, finalmente a moça se pôs à frente de Marcos e disse:

   — Venha meu jovem, contemplarás maravilhas! — Ele por um instante hesitou! — Vendo sua hesitação a jovem mansamente e com um sorriso no rosto afirmou: — Não tenhas medo, nenhum mal o atingirá neste lugar!

quinta-feira, 18 de maio de 2017

O Lago Verde - Parte 3

 


   O esposo de prontidão rebateu:

   - Fique tranquila minha querida, ele mesmo fez questão de vir! - Nosso filho irá se distrair e curtir as férias com os irmãos! - Mas para te deixar mais calma vamos pernoitar em uma pousada que se localiza nesse mesmo lugar!

   Passado o diálogo não tardaram em avistar a hospedaria, juntamente a ela o posto de gasolina. Sem demora o automóvel foi estacionado com o intuito de abastecê-lo. A família já se encontrando cansada pela desgastante viagem, encaminha-se à pousada.

   - Meu filho, acorda!

   Obedecendo a ordem de sua mãe, Marcos desperta do sono, só que para sua surpresa não era ela. Ele espiou em todos os lados, ninguém por perto, nenhuma alma viva. De repente notou-se no meio do nada, abandonado na estrada, a única lembrança é o carro ali parado.

   - O que está acontecendo? - Perguntou o rapaz a si mesmo.

   Depois de algum tempo chamando pelos seus pais e irmãos, a agonia avançava pela falta de resposta. Vendo-se perdido, o garoto sentia o desespero bater à sua porta. Considerando sua pouca idade era um fardo muito pesado de suportar.

   - Socorro! - Alguém me ajude! - Gritou o jovem!

   O que se seguiu foi um silêncio aterrador. Contudo, neste ínterim, Marcos vislumbra um clarão, uma grande luz branca resplandecendo no meio de toda a escuridão. Imediatamente a atração foi maior que o medo como um inseto hipnotizado por uma lâmpada. Os primeiros passos em direção à claridade foram lentos, inseguros, cercados de dúvidas. Indecisões, às quais, convertidas em fascínio, tamanho a grandeza desse brilho.

terça-feira, 16 de maio de 2017

O Lago Verde - Parte 2

   

   E a viagem prosseguia, todavia, nesta ocasião, o percurso seria muito mais longo. Um dia e uma noite seriam precisos a fim de chegarem ao ponto de destino. Independente do cansaço, os viajantes encontram disposição de permanecerem acordados, os mínimos detalhes eram registrados pelos ocupantes daquele carro.

   No instante em que a noite finalmente se fez presente, trouxe também a lua e as estrelas. O céu limpo, sem nuvens, colabora fielmente com toda essa beleza encantadora. No entanto, mais uma vez, Marcos não se encontrava no mesmo contexto de sua família. O menino após ingerir o remédio, adormecera no banco de trás.

   Vendo seu filho adormecido e com fisionomia sofrida, a mãe zelosa estende seus braços com a intenção de ajeitá-lo melhor. Por mais que todos os cuidados fossem providenciados, o prolongado passeio maltratava o pobre braço.

   - Marido, temos que parar um pouco para esticar as pernas! - Disse a esposa.

   - Logo à frente há um local de parada! - Respondeu o homem. E continuando disse:

   - Temos que abastecer de qualquer forma, vamos aproveitar e jantar em seguida! Respondeu prontamente.

   A mulher retomando a fala completou:

   - Estou um pouco aflita com o nosso filho! - Talvez não devíamos ter feito essa viagem, está sendo um sacrifício para ele! - Falou a mãe apreensiva.

Primeiro Milagre de Santa Teresinha na Madeira no dia de sua morte

          Ao cair da tarde do dia 30 de Setembro de 1897, a florzinha branca do Carmelo escuta a Voz do Senhor da Vida e da Morte, pronto a “romper a teia deste doce encon­tro”, na expressão feliz da poesia mística de S. João da Cruz, em Chama viva de Amor.
          Perto da janela da enfermaria, o canto alegre e pertinente de um passarinho aumenta a tristeza das Irmãs Martin, também carmelitas, que velam junto do benjamim da família – a Ir. Teresinha do Meni­no Jesus e da Santa Face. No limi­ar da eternidade, lança à sua prioresa, Madre Gonzaga, um derradeiro olhar, humilde e supli­cante: “Apresente-me depressa à Santíssima Virgem, eu sou um bebé que não pode mais!... Prepare-me para morrer bem...” (Últi­mos Conselhos e Recordações). No meio de indizíveis sofrimentos físi­cos e espirituais, irrompe dos seus lábios moribundos um grito de amor: “Não me arrependo de me ter entregue ao Amor. Meu Deus, eu amo-Vos. Oh! Amo-Vos!” (Caderno Amarelo).
          Pouco depois, com o rosto trans­figurado e iluminado por inexplicá­vel luz celeste, falecia santamente. Tinha 24 anos de idade e nove de vida consagrada na Ordem de Nos­sa Senhora do Carmo.
          O seu belo sorriso e a novidade da espiritualidade da infância, nar­rada na sua autobiografia – Histó­ria de uma Alma – depressa con­quistaram o mundo. Mas, em 1897, era ainda muito pouco conhecida fora dos muros do seu Carmelo.

A força da oração, uma chuva de rosas
 
         Decorria o ano de 1897. A Irmã Virgínia da Paixão, a humilde reli­giosa clarissa do Mosteiro de Nos­sa Senhora das Mercês no Funchal, encontrava-se gravemente doente, devido a uma queda nas escadas. Esta enfermidade fazia-a sofrer imenso, não só pelas dores físicas, mas pela relutância que experimen­tava em deixar-se examinar pelo médico. Com a força das dores não conseguia conciliar o sono. Na noi­te de 30 de Setembro, sentindo au­mentar os sofrimentos, pediu ao Senhor que a curasse por interces­são da primeira alma que entrasse naquele momento no Paraíso. A resposta do céu não se fez esperar. Narra-nos a Madre Virgínia nos seus escritos: “Senti uma mão invi­sível que me tocava e vi junto do meu leito uma religiosa vestida de hábito pardo, manto branco e véu preto na cabeça. Conheci que não era a nossa enfermeira. Era manhã, mas ainda fazia escuro, e reconhe­ci à luz bruxuleante da lâmpada, que era uma religiosa nova e muito formosa. Referiu que Jesus, respon­dendo à minha súplica, a tinha en­viado para lhe dizer ser Sua vonta­de me submetesse ao exame clínico prescrito e me deixasse tratar. Ela seria a minha fiel enfermeira. Perguntei-lhe quem era. Por fim, sor­riu e disse: eu sou uma religiosa carmelita, chamada Teresa do Me­nino Jesus e da Santa Face, que acabo a vida mortal e entro já no Paraíso. Recomendou-me segredo até ao tempo que aprouvesse ao di­vino Senhor revelar (o milagre) e desapareceu” (Apontamento Bio­gráfico do Padre João Prudêncio da Costa).
          A Madre Virgínia relata que o médico fez a intervenção cirúrgica conveniente e que Santa Teresinha do Menino Jesus foi a sua fiel e de­dicada enfermeira, tirando-lhe to­das as dores. “Fiquei perfeitamente boa. Fui curada milagrosamente. Isto deu-se no dia 30 de Setembro para 1 de Outubro de 1897. No dia 4, festa do meu Pai S. Francisco, já pude tomar parte nas funções da comunidade”. Clinicamente era inexplicável como em tão pouco tempo se realizou a prodigiosa cu­ra. Mistérios de Deus: nesse mes­mo dia, em Lisieux, realizava-se o funeral de Santa Teresinha do Me­nino Jesus e da Santa Face.

terça-feira, 9 de maio de 2017

Santa Teresinha apareceu em Portugal

Santa Teresinha apareceu em Portugal
          Na tarde do dia 30 de Setem­bro 1897 faleceu no Carmelo de Lisieux na França, Santa Tere­sinha do Menino Jesus. Nessa mesma hora e dia desceu ela a Portugal, à cidade do Funchal, na Ilha da Madeira.
          Vivia ali uma religiosa capuchinha chamada Virgínia da Pai­xão, falecida há anos, com fama de santidade, a qual padecia de grave doença no peito. O seu profundo pudor e delicadeza de consciência traziam-lhe o cora­ção inquieto e hesitante: devia ou não permitir que os médicos a descobrissem e operassem? Voltando-se para Deus disse:
          – Senhor, a alma que hoje en­trar no Céu, mandai-ma para me tirar de tão aflitiva indecisão.
          Uma jovem freira sorridente, com hábito de carmelita, apareceu-lhe nessa tarde de 30 de Se­tembro e aconselhou-a a submeter-se à operação.o sur­preendente, voltou a aparecer-lhe e fez-lhe com tal delicadeza e perfeição o penso que o médi­co ficou espantado. Mais admi­rado ainda ficou com a rapidez da cicatrização.
          A Madre Virgínia pergunta-va-se a si própria: – Que misté­rio é este? As religiosas carme­litas não saem do convento, nem são enfermeiras. Quem se­ria aquela que me veio aconse­lhar e tratar?
          Passados anos chega ao Fun­chal um retrato autêntico de Santa Teresinha. A Madre Vir­gínia olha-a, fixa-a e exclama:
          – Foi esta Irmã que me apa­receu e me curou.
          Santa Teresinha, “a maior Santa dos tempos modernos”, – como dizia o Papa Pio XI – logo que faleceu deu-se pressa em descer a Portugal, cumprin­do o que prometeu pouco antes da morte: “– Quero passar o meu Céu a fazer bem na terra. Farei descer do Céu uma chuva de rosas. Sinto que vai princi­piar a minha missão, a missão que tenho de fazer amar a Deus como eu O amo”.
Fonte: revista Cruzada, Junho 1989, p. 183.


terça-feira, 2 de maio de 2017

A Primeira Rosa de Santa Teresinha




A PRIMEIRA ROSA DE SANTA TERESINHA
A CELESTE SEMEADORA DE ROSAS
desceu à Ilha da Madeira, no próprio dia da sua morte

          Enquanto um coro possante de vozes, no cinquentenário da morte de Santa Teresinha, invocava e aclamava, em Lisboa, a Padroeira de Portugal Missionário, a evocação da sua morte, trazia-nos à lembrança um episódio enternecedor da sua legenda maravilhosa, demonstrativo da sua predileção pela terra querida de Portugal, para o exercício da sua missão providencial.
          Na noite do próprio dia em que, há 50 anos, se finara, no Mos­teiro do Carmelo, Teresinha desceu, decerto pela primeira vez depois da morte, à terra abençoada de Portugal. Ao apelo da Madre Vir­gínia da Paixão, das Capuchinhas de Nossa Senhora das Mercês, do Funchal, desceu a Santinha à terra florida da Madeira, açafate de rosas, embalado pela vagas rendilhadas de espuma do Atlântico.
          Esta religiosa, falecida, no Funchal, há anos, em odor de santidade, padecia de gravíssima moléstia no peito. A delicadeza da sua cons­ciência, num requinte de pudor, trazia-lhe o coração inquieto e hesi­tante em se submeter à inspeção dos médicos. No dia 30 de Setembro de 1897, voltando-se para Deus, disse: – Senhor, a alma, que hoje entrar no Céu, mandai-ma, para me tirar de tão aflitiva indecisão.
          Uma freira sorridente, com hábito de carmelita, apareceu-lhe, então, na noite do memorável dia 30, e aconselhou-a a submeter-se à operação. Feita a operação, com êxito surpreendente, voltou a aparecer-lhe a risonha carmelita e fez-lhe o penso, com tal perícia, que o médico ficou pasmado, ao tirá-lo, quando verificou a rapidez da cica­trização e a perfeição do penso, inverosímil em mãos humanas.
          Só ao cabo de alguns anos, conseguiu apurar o nome e identidade desta carmelita, tão singular por andar fora da clausura, em serviço de enfermeira e taumaturga. Passados anos, em face de retrato autêntico, com o nome e data da morte de Soror Teresa do Menino Jesus, acabado de chegar ao Funchal, reconheceu a piedosa capuchinha, deliciosamente surpreendida, que a carmelita incógnita, que lhe servira de enfermeira, com mão delicada a curara e lhe aparecera, pela primeira vez, em 30 de Setembro de 1897, tinha sido a própria Santa Teresinha que, pouco depois de voar ao Céu, se deu pressa a descer à terra sagrada de Portugal, para iniciar a sua missão de bem-fazer, desfolhando, sobre a capuchinha padecente, as perfumadas rosas do milagre.
          No quinquagésimo aniversário da sua entrada triunfal no Céu e da sua descida maravilhosa à terra lusitana, bem merecia, pois, a gentilíssima Santinha que, em Lisboa, cabeça do Império, solar prin­cipesco de missionários e navegadores, berço de heróis e santos, se levantasse, sob as abóbadas do grandioso templo das Mercês, o con­certo imponente de louvores, o coral vibrante de aclamações com que se fechou, em Portugal, o ciclo das festas do Ano Jubilar Teresiano.  
Fonte: revista Rosas de Santa Teresinha, 1947, p. 8.
(Publicação dirigida pelo Pe. Marques Soares) 

segunda-feira, 1 de maio de 2017

O Lago Verde - Parte 1







       Final de tarde. Antes de a noite dar o ar de sua graça, os últimos raios de sol reluzem sobre o asfalto anunciando o anoitecer que se aproxima. A longa estrada rodeada de uma grande mata destaca ainda mais o pôr-do-sol em meio àquela natureza deslumbrante. 

    Contrastando com esse cenário, um automóvel solitário percorre o trajeto de modo dominante. No interior desse veículo, uma família desfruta de momentos de descontração, além das férias que estava apenas começando para aquelas pessoas. Conversas dos mais variados assuntos colaboram para que a interação entre os familiares atinja um alto grau de intimidade. 

       Todos estavam tomados de uma grande alegria, bem como se maravilhavam com o ambiente ao redor. Porém, apesar de toda a harmonia, havia um que destoava dos demais, Marcos. Um adolescente de quinze anos de idade, estudioso, de temperamento introspectivo e, por essa razão, de poucos amigos. 

       Mas, desta vez, o garoto até se dava ao direito de se reservar a esse comportamento, um dos seus braços sofrera uma grave fratura exposta e, a partir daí, o sofrimento se tornou uma constante em sua vida. Apesar de a cirurgia ter sido um sucesso, algum tempo ainda seria preciso para se ter certeza de que nenhuma sequela fosse adquirida.

       — Filho, está na hora do seu remédio! — Avisa a mãe cuidadosa!

      Naquele momento do dia o analgésico não deixava de ser administrado a fim de amenizar uma dor à qual teimava em incomodar o menino. De imediato, o medicamento foi ingerido trazendo conforto ao braço fraturado.

Viver de Amor - Poema de Santa Teresinha



No entardecer do Amor, falando sem figuras,
Assim disse Jesus: “Se alguém Me quer amar,
Saiba sempre guardar Minha Palavra
Para que o Pai e Eu o venhamos visitar.
Se do seu coração fizer Nossa morada,
Vindo até ele, então, haveremos de amá-lo
E irá, cheio de paz, viver
Em Nosso amor!”
.
Viver de Amor, Senhor, é Vos guardar em mim,
Verbo incriado, Palavra de meu Deus,
Ah, divino Jesus, sabes que Vos amo sim,
O Espírito de Amor me abrasa em chama ardente;
Somente enquanto Vos amo o Pai atraio a mim.
Que Ele, em meu coração, eu guarde a vida inteira,
Tendo a Vós, ó Trindade, como prisioneira
Do meu Amor!…
.
Viver de Amor é viver da Vossa vida,
Delícia dos eleitos e glorioso Rei;
Vives por mim numa hóstia escondido,
Escondida também por Vós eu viverei!
Os amantes procuraram sempre a solidão:
Coração, noite e dia, em outro coração;
Somente Vosso olhar me dá felicidade:
Vivo de Amor!
.
Viver de amor não é, nesta terra,
A nossa tenda armar nos cumes do Tabor;
É subir o Calvário com Jesus,
Como um tesouro olhar a Cruz!
No céu eu viverei de alegrias,
Quando, então, todo sofrimento acabará:
Mas, enquanto exilada, quero, no sofrimento
Viver de Amor!
.
Viver de Amor, é dar, dar sem medida,
Sem reclamar na vida recompensa.
Eu dou sem calcular, por estar convencida
De que quem ama nunca em pagamento pensa!…
Ao Coração Divino, que é só ternura em jorro,
Em tudo já entreguei! Leve e ligeira eu corro,
Só tendo esta riqueza tão apetecida:
Viver de Amor!
.
Viver de Amor, banir todo o temor
E lembranças das faltas do passado,
Não vejo marca alguma em mim só segundo…
Chama divina, ó doce fornalha,
Quero, no vosso calor, fixar minha morada
E, em vosso fogo é que canto o refrão mais profundo:
“Vivo de Amor!…”
.
Viver de Amor, guardar dentro do peito
Tesouro que se leva em vaso mortal.
Meu Bem-Amado, minha fraqueza é extrema,
Estou longe de ser um anjo celestial!…
Mas, se venho a cair cada hora que passa,
Em meu socorro vens,
A todo instante me dás Vossa graça:
Vivo de Amor!
.
Viver de Amor é velejar sem descanso,
Semeando nos corações a paz e a alegria.
Timoneiro amado, a caridade me impulsiona.
Pois te vejo nas almas, minhas irmãs.
A caridade é minha única estrela
E, à sua doce luz, navego noite e dia,
Ostentando este lema, impresso em minha vela:
“Viver de Amor!”
.
Viver de amor, enquanto meu Mestre cochila,
Eis o repouso entre as fúrias da vaga.
Oh! não temas, Senhor, que eu Vos acorde,
Aguardo em paz a margem dos céus…
Logo a fé irá rasgar Vosso véu,
Minha esperança é ver-Vos um dia.
A Caridade infla e empurra minha vela,
Vivo de Amor!…
.
Viver de Amor, ó meu Divino Mestre,
É pedir-Vos que acendas Vossos Fogos
Na alma santa e consagrada de Vosso Padre
Que ele seja mais puro que um Serafim dos céus!…
Vossa Igreja imortal, ó Jesus, glorifica
Sem fechar Vosso ouvido a meus suspiros;
Por ela Vossa filha aqui se sacrifica,
Vivo de Amor!
.
Viver de Amor, Jesus, é enxugar Vossa Face
E obter de Vós perdão para os pecadores.
Deus de Amor, que eles voltem à Vossa graça
E para todo o sempre Vosso Nome bendigam.
Ressoa em meu peito a blasfêmia;
para poder apagá-la estou sempre a cantar:
“Vosso Nome sagrado hei de amar e adorar;
Vivo de Amor!…”
.
Viver de Amor é imitar Maria,
Banhando, com seu pranto e com perfumes raros,
Os pés divinos que beijava embevecida,
Para, depois, com seus cabelos enxugá-los…
Levanta-se, a seguir, quebra o vaso
E Vossa Doce Face perfuma…
Mas Vossa Face eu só perfumo, bom Senhor,
Com meu Amor!
.
“Viver de Amor, estranha loucura”,
Vem o mundo e me diz, “pára com esta glosa,
Não percas o perfume e a vida que é tão boa,
Aprende a usá-los de maneira prazerosa!”
Amar-Vos é, então, Jesus, desperdício fecundo!…
Todos os meus perfumes dou-Vos para sempre,
E desejo cantar, ao sair deste mundo:
“Morro de Amor!”
.
Morrer de Amor é bem doce martírio:
Bem quisera eu sofrer para morrer assim…
Querubins, todos vós, afinai vossa lira,
Sinto que meu exílio está chegando ao fim!
Chama de Amor,vem consumir-me inteira.
Como pesa teu fardo, ó vida passageira!
Divino Jesus, realiza meu sonho:
Morrer de Amor!…
.
Morrer de Amor, eis minha esperança!
Quando verei romperem-se todos os meus vínculos,
Só meu Deus há de ser a grande recompensa
E não quero possuir outros bens,
Abrasando-me toda em Seu Amor,
A Ele quero unir-me a vê-lO:
Eis meu destino, eis meu céu:
Viver de Amor!!!

segunda-feira, 24 de abril de 2017

Súplica a Santa Teresinha



                                    Santa Teresinha atira flores ao Santíssimo Sacramento

Santa Teresa do Menino Jesus, concede-me que siga a tua vida de Infância Espiritual, que viva no espírito de simplicidade e humildade evangélicas, num total abandono à vontade do Senhor. Ensina-me a aceitar cada sofrimento como dom precioso feito a quem mais ama. Que eu possa também terminar a minha vida terrena, repetindo as tuas últimas palavras: «Meu Deus, eu amo-Te».

sexta-feira, 21 de abril de 2017

Oração a Santa Teresinha



Oração a Santa Teresinha 

Ó Santa Teresinha do Menino Jesus, branca e mimosa flor de Jesus e de Maria que embalsamais o Carmelo e o mundo inteiro com vosso suave perfume, atrai-nos e convosco correremos em seguimento de Jesus, nosso Deus e único bem, no caminho da renúncia, do amor e do abandono.
Ò Santa Teresinha, fazei-nos simples e dóceis, humildes e confiantes para com nosso Pai do céu. Ah! Não permitais que ofendamos pelo pecado, que O contristemos pela desconfiança! Assisti-nos em todos os perigos e necessidade; socorrei-nos em todas as aflições; alcançai-nos todas as graças espirituais e temporais, particularmente (...), valei-nos na vida e na morte.
Ó Santa Teresinha lembrai-vos que prometestes passar o vosso céu fazendo o bem na terra, sem descanso até ver completo o número de eleitos. Ah! Cumpri em vós nossa promessa: sede nosso anjo protetor na travessia desta vida e não descanseis até que nos vejais no céu cantando ao vosso lado eternamente as ternuras do amor misericordioso do coração de Jesus. Amém.
(Pai-nosso, Ave-Maria, Glória-ao-Pai).

quarta-feira, 19 de abril de 2017

Os Escritos de Santa Teresinha

Primeira Comunhão
Na véspera do grande dia, recebi a absolvição pela segunda vez. A minha confissão geral deixou-me uma grande paz na alma, e Deus não permitiu que a mais ligeira nuvem a viesse perturbar. De tarde pedi perdão a toda a família, que me veio visitar; mas não pude falar senão com as minhas lágrimas, pois estava emocionada demais[…]
Chegou finalmente o mais belo dos dias! Que inefáveis recordações deixaram na minha alma os mais pequenos pormenores desse dia do Céu!… O alegre despertar da aurora, os beijos respeitosos e ternos das mestras e das companheiras mais velhas…; o salão cheio de flocos de neve com que cada menina era vestida…; e sobretudo a entrada para a capela e o cantomatinal da linda canção: «Ó Altar santo que os Anjos rodeiam!»
Mas não quero entrar em pormenores. Há coisas que perdem o seu perfume quando expostas ao ar; há pensamentos da alma que não se podem traduzir em linguagem da terra sem perderem o sentido íntimo e celeste; são como aquela «Pedra branca que será dada ao vencedor, sobre a qual está escrito um nome que ninguém conhece, a não ser aquele que a recebe». Ah! como foi doce o primeiro beijo de Jesus à minha alma!…
Foi um beijo de amor. Sentia-me amada e dizia por minha vez: «Eu amo-Vos! Dou-me a Vós para sempre!» Não houve pedidos, nem lutas, nem sacrifícios. Desde há muito, Jesus e a pobre Teresinha tinham-se olhado e tinham-se compreendido… Nesse dia já não era um olhar, mas uma fusão, já não eramdois: a Teresa desaparecera como a gota de água que se perde no oceano. Só ficava Jesus, como dono, como Rei.
(História de uma Alma, Ms A 34v-35rº)

Um Caminhito Completamente Novo
Bem sabeis, minha Madre, que sempre desejei ser santa.
Mas, ai de mim! sempre verifiquei, ao comparar-me com os Santos, que há entre eles e eu a mesma diferença que existe entre uma montanha, cujo cume se perde nos céus, e o obscuro grão de areia  pisado pelos pés dos caminhantes. Em vez de desanimar, disse para comigo: Deus não pode inspirar desejos irrealizáveis. Posso, portanto, apesar da minha pequenez, aspirar à santidade. Fazer-me crescer a mim mesma é impossível; tenho de suportar-me tal como sou, com todas as minhas imperfeições. Mas quero procurar a maneira de ir para o Céu por um caminhito muito direito, muito curto; um caminhito completamente novo.
(História de uma Alma, Ms C 2vº)
Se alguém for pequenino…
Estamos num século de invenções.
Agora já não se tem a maçada de subir os degraus de uma escada; em casa dos ricos o ascensor substitui-a vantajosamente. Eu queria também encontrar um ascensor que me elevasse até Jesus, porque sou demasiado pequena para subir a rude escada da perfeição. Então, procurei nos Livros Sagrados a indicação do ascensor — objecto do meu desejo —, e li as estas palavras saídas da boca da Sabedoria eterna: Se alguém for pequenino, venha a mim.
Então, aproximei-me, adivinhando que tinha encontrado o que procurava, e querendo saber, ó meu Deus!, o que faríeis ao pequenino que respondesse ao vosso apelo. Continuei as minhas buscas, e eis o que encontrei: — Como uma mãe acaricia o seu filho, assim eu vos consolarei; levar-vos-ei ao colo e embalar-vos-ei nos meus joelhos! Ah!, nunca palavras tão ternas e tão melodiosas me vieram alegrar a alma.
O ascensor que me há-de elevar até ao Céu, são os vossos braços, ó Jesus! Para isso não tenho necessidade de crescer; pelo contrário, é preciso que eu permaneça pequena, e que me torne cada vez mais pequena. Ó meu Deus! excedestes a minha esperança, e eu quero cantar as vossas misericórdias.
(História de uma Alma, Ms C 3rº)
Boa Vontade
Tu fazes-me pensar numa criancinha que começa a erguer-se de pé, mas que ainda não sabe caminhar. Querendo a todo o custo subir ao alto duma escada para estar com a sua mamã, levanta o pézito para subir o primeiro degrau. Mas é um esforço inútil! Cai uma e outra vez, sem chegar a avançar. Muito bem: aceita ser essa criança. Pela prática de todas as virtudes, levanta sempre o teu pézito para subires a escada da santidade. Não conseguirás subir o primeiro degrau sequer. Mas o que Deus apenas te pede é a tua boa vontade. Do alto da escada Ele olha-te com amor. Rapidamente vencido pelos teus inúteis esforços, Ele-mesmo baixará e tomando-te nos seus braços, levar-te-á para sempre para o seu reino, onde jamais te afastarás dEle. Mas se não chegares a levantar o teu pézito Ele deixar-te-á muito tempo na terra.
(Caderno Vermelho, escrito pela Irmã Maria da Trindade)
Desejo ser Santa
Ó meu Deus! Trindade Bem-aventurada!
Desejo amar-Vos e fazer‑Vos amar, trabalhar pela glorificação da Santa Igreja, salvando as almas que estão na terra, e libertando as que estão no Purgatório. Desejo cumprir plenamente a vossa vontade, e chegar ao grau de glória que me preparastes no vosso Reino; numa palavra, desejo ser santa. Mas conheço a minha impotência, e peço-Vos, ó meu Deus, que sejais Vós mesmo a minha Santidade.
Já que Vós me amastes até me dardes o vosso Filho único para ser o meu Salvador e o meu Esposo, os tesouros infinitos dos seus méritos são meus: ofereço-Vo-los com alegria, suplicando-Vos que não olheis para mim senão através da Face de Jesus e no seu Coração ardente de Amor.
(Oração 6: 1-2)

O Pequeno Passarinho
O passarinho quereria voar para o Sol brilhante que lhe fascina o olhar;
quereria imitar as Águias, suas irmãs, que vê elevarem-se até ao fogo divino da Santíssima Trindade… Pobre dele! tudo quanto pode fazer é agitar as suas pequenas asas; mas levantar voo, isso não está no seu pequeno poder! Que será dele? Morrerá de desgosto, ao ver-se impotente?… Oh, não! o passarinho nem sequer se vai afligir. Com um audacioso abandono, quer ficar a fixar o seu divino Sol. Nada seria capaz de o assustar, nem o vento nem a chuva; e se nuvens sombrias chegam a esconder o Astro do Amor, o passarinho não muda de lugar, pois sabe que para além das nuvens o seu Sol brilha sempre, e que o seu brilho não se poderia eclipsar nem por um instante sequer.
É verdade que às vezes  o coração do passarinho se vê acometido pela tempestade; parece-lhe não acreditar que existe outra coisa, a não ser as nuvens que o envolvem. É então o momento da alegria perfeita para a pobre e débil criaturinha. Que felicidade para ela, permanecer ali, apesar de tudo, e fixar a luz invisível que se esconde à sua fé!!!…
Jesus, até agora compreendo o teu amor para com o passarinho pois ele não se afasta de Ti. Mas eu sei, e Tu também o sabes, muitas vezes a imperfeita criaturinha, ficando embora no seu lugar (isto é, sob os raios do Sol), deixa‑se distrair um pouco da sua única ocupação; apanha um grãozito à direita e à esquerda, corre atrás de um vermezito… Depois, encontrando uma pocita de água, molha as penas ainda mal formadas; quando vê uma flor que lhe agrada o seu espírito entretém-se com essa flor… Enfim! não podendo pairar como as Águias, o pobre passarinho entretém-se ainda com as bagatelas da terra. Não obstante, depois de todas as suas travessuras, em vez de se ir esconder num canto para chorar a sua miséria e morrer de arrependimento, o passarinho volta-se para o seu Bem‑amado Sol, expõe as asitas molhadas aos seus raios benfazejos, geme como a andorinha e, no seu doce cantar, confia, conta em pormenor as suas infidelidades, pensando, no seu temerário abandono, conseguir assim maior influência e atrair mais plenamente o amor d’Aquele que não veio chamar os justos mas os pecadores… Se o Astro Adorado continuar surdo ao chilrear plangente da sua criaturinha, se permanecer velado…, pois bem: a criaturinha continua molhada, aceita ficar transida de frio, e ainda se alegra com esse sofrimento que, aliás, mereceu…
Ó Jesus! como o teu passarinho está contente por ser débil e pequeno. Que seria dele se fosse grande?… Nunca teria a audácia de aparecer na tua presença, de dormitar diante de Ti… Sim, aí está mais uma fraqueza do passarinho: quando quer fixar o Divino Sol, e as nuvens o impedem de ver um único raio, contra sua vontade os seus olhitos fecham-se, a sua cabecinha esconde-se debaixo da asita, e a pobre criaturinha adormece, julgando fixar ainda o seu Astro Querido. Ao acordar, não fica desolado, o seu coraçãozinho fica em paz, e recomeça o seu ofício de amor. Invoca os Anjos e os Santos que se elevam como Águias em direcção ao Fogo devorador, objecto do seu desejo.
E as Águias, compadecendo-se do seu irmãozinho, protegem-no, defendem-no, e põem em fuga os abutres que o queriam devorar. Os abutres, imagem do demónio, o passarinho não os teme, pois não está destinado a ser presa deles, mas da Águia que contempla no centro do Sol do Amor.
Por tanto tempo quanto quiseres, ó meu Bem-amado, o teu passarinho ficará sem forças e sem asas; permanecerá sempre com os olhos fixos em Ti. Quer ser fascinado pelo teu divino olhar, quer tornar‑se a presa do teu Amor… Um dia, assim o espero, Águia adorada, virás buscar o teu passarinho e, subindo com ele para o Fogo do Amor, mergulhá‑lo‑ás eternamente no ardente Abismo desse Amor, ao qual se ofereceu como vítima…
(História de uma Alma, Ms B 5rº-vº)
A Oração levanta o Mundo
Um sábio disse:
«Dai-me uma alavanca, um ponto de apoio, e levantarei o mundo». O que Arquimedes não pôde obter, porque o seu pedido não se dirigia a Deus, e por não ser feito senão sob o ponto de vista material, os Santos obtiveram-no em toda a plenitude: o Todo-poderoso deu-lhes, como ponto de apoio: Ele mesmo e Ele só; e como alavanca: a oração, que abrasa com fogo de amor. E foi assim que levantaram o mundo; é assim que os santos que ainda militam na terra o levantam, e que, até ao fim do mundo, os futuros santos o levantarão também.
(História de uma Alma, Ms C 36rº-vº)
Lançar Flores
Sim, meu Bem-amado!
Assim se consumirá a minha vida… Não tenho outro meio de Te provar o meu amor, senão o de lançar flores, isto é, não deixar escapar nenhum pequeno sacrifício, nenhum olhar, nenhuma palavra; aproveitar todas as mais pequenas coisas e fazê-las por amor… Quero sofrer por amor e gozar por amor. Assim lançarei flores diante do teu trono. Não encontrarei nenhuma sem a desfolhar para Ti…
(História de uma Alma, Ms B 4rº-vº)
O Fogo do Amor
Celina, Deus não me pede já nada…
No princípio pedia-me uma infinidade de coisas. Pensei durante algum tempo, visto que Jesus não me pedia nada, que agora era preciso caminhar suavemente na paz e no amor fazendo somente o que Ele me pedisse… Mas tive uma luz. Santa Teresa diz que é preciso alimentar o amor. A lenha não se encontra ao nosso alcance quando estamos nas trevas, na aridez, mas não estaremos ao menos obrigadas a lançar nele algumas palhinhas? Jesus é suficientemente poderoso para conservar sozinho o fogo, todavia fica contente por nos ver alimentá-lo, é uma delicadeza que Lhe agrada e então lança Ele no fogo muita lenha, nós não o vemos mas sentimos a força do calor do amor. Tenho feito disto a experiência, quando não sinto nada, quando sou incapaz de rezar, ou de praticar a virtude, é então o momento de procurar pequenas ocasiões, nadas que dão gosto, mais gosto a Jesus do que o império do mundo ou mesmo do que o martírio sofrido generosamente, por exemplo, um sorriso, uma palavra amável quando teria vontade de não dizer nada ou de mostrar um ar aborrecido, etc., etc.
(Carta 143)
O Divino Prisioneiro
Como ter medo d’Aquele que Se deixa prender por um cabelo que esvoaça no nosso pescoço!…
Saibamos pois conservar prisioneiro este Deus que Se faz mendigo do nosso amor. Ao dizer-nos que um só cabelo pode realizar este prodígio, mostra-nos que as mais pequenas acções feitas por amor são as que Lhe cativam o coração…
Ah! se fosse preciso fazer grandes coisas, quanto seríamos para lastimar?… Mas como somos felizes visto que Jesus se deixa prender pelas mais pequeninas…
(Carta 191)
Amor, a chave da vocação
Considerando o corpo místico da Igreja, não me tinha reconhecido em nenhum dos membros descritos por S. Paulo; ou melhor, queria reconhecer-me em todos… A caridade deu‑me a chave da minha vocação. Compreendi que se a Igreja tinha um corpo composto de diversos membros, o mais necessário, o mais nobre de todos não lhe faltava: compreendi que a Igreja tinha um coração, e que esse coração estava ardendo de amor. Compreendi que só o Amor fazia agir os membros da Igreja; que se o Amor se apagasse, os apóstolos já não anunciariam o Evangelho, os mártires recusar-se-iam a derramar o seu sangue… Compreendi que o Amor encerra todas as Vocações, que o Amor é tudo, que abarca todos os tempos e todos os lugares… numa palavra, que é Eterno!…
(História de uma Alma, Ms B 3vº)
Ato de oferenda ao amor misericordioso
Ó meu Deus! Trindade Bem-aventurada! Desejo amar-Vos e fazer‑Vos amar, trabalhar pela glorificação da Santa Igreja, salvando as almas que estão na terra, e libertando as que estão no Purgatório. Desejo cumprir plenamente a vossa vontade, e chegar ao grau de glória que me preparastes no vosso Reino; numa palavra, desejo ser santa. Mas conheço a minha impotência, e peço-Vos, ó meu Deus, que sejais Vós mesmo a minha Santidade.
Já que Vós me amastes  até me dardes o vosso Filho único para ser o meu Salvador e o meu Esposo, os tesouros infinitos dos seus méritos são meus: ofereço-Vo-los com alegria, suplicando-Vos que não olheis para mim senão através da Face de Jesus e no seu Coração ardente de Amor.
Ofereço-Vos também todos os méritos dos Santos (que estão no Céu e na terra), os seus actos de Amor, e os dos Santos Anjos. Finalmente, ofereço-Vos, ó Bem-aventurada Trindade, o Amor e os méritos da Santíssima Virgem, minha querida Mãe: é a ela que entrego o meu oferecimento, pedindo-lhe que Vo-lo apresente.
O seu divino Filho, meu Esposo Bem-amado, nos dias da sua vida mortal, disse-nos: «Tudo o que pedirdes ao meu Pai em meu nome, Ele vo-lo concederá!». Tenho, portanto, a certeza de que atendereis os meus desejos.
Bem sei, ó meu Deus, quanto mais quereis dar, mais fazeis desejar. Sinto no meu coração desejos imensos, e é com confiança que Vos peço que venhais tomar posse da minha alma. Ah! não posso receber a Sagrada Comunhão tantas vezes quantas desejo, mas, Senhor, não sois Todo-poderoso?… Ficai em mim, como no Sacrário. Nunca Vos afasteis da vossa hostiazinha…
Quereria consolar-Vos da ingratidão dos maus, e suplico-Vos que me tireis a liberdade de Vos desagradar. Se, por fraqueza, cair algumas vezes, que logo o vosso divino olhar purifique a minha alma, consumindo todas as minhas imperfeições, como o fogo, que transforma em si próprio todas as coisas…
Agradeço-Vos, ó meu Deus, por todas as graças que me concedestes,  especialmente por me terdes feito passar pelo crisol do sofrimento. Será com alegria que Vos contemplarei no último dia, levando o ceptro da Cruz. Já que Vos dignastes dar-me em herança esta Cruz tão preciosa, espero parecer-me convosco no Céu, e ver brilhar no meu corpo glorificado os sagrados estigmas da vossa Paixão… Depois do exílio da terra, espero ir gozar de Vós na Pátria, mas não quero acumular méritos para o Céu, quero trabalhar só por vosso Amor, com o único fim de Vos agradar, de consolar o vosso Coração Sagrado, e de salvar almas que Vos amarão eternamente.
Na noite desta vida, aparecerei diante de Vós com as mãos vazias, pois não Vos peço, Senhor, que conteis as minhas obras. Todas as nossas justiças têm manchas aos vossos olhos. Quero, portanto, revestir-me com a vossa própria Justiça, e receber do vosso Amor a posse eterna de Vós mesmo. Não quero outro Trono, nem outra Coroa, senão Vós, ó meu Bem-amado!…
Aos vossos olhos, o tempo não é nada: um só dia é como mil anos; podeis, portanto, num instante, preparar-me para aparecer diante de Vós…
A fim de viver num acto de perfeito Amor, ofereço-me como vítima de holocausto ao vosso amor misericordioso, suplicando-Vos que me consumais sem cessar, deixando transbordar para a minha alma as ondas de ternura infinita que estão encerradas em Vós, e que assim eu me torne Mártir do vosso Amor, ó meu Deus!…
Que este Martírio, depois de me ter preparado para aparecer diante de Vós, me faça, enfim, morrer, e que a minha alma se lance, sem demora, no eterno abraço do vosso Amor misericordioso…
Quero, ó meu Bem-amado, a cada palpitação do meu coração, renovar-Vos este oferecimento um número infinito de vezes, até ao momento em que, desvanecidas as sombras, possa reafirmar-Vos o meu Amor num face-a-face eterno!…
A caridade perfeita
Ah! compreendo agora que a caridade perfeita consiste em suportar os defeitos dos outros, em não se escandalizar com as suas fraquezas, em edificar-se com os mais pequenos actos de virtude que se lhes vir praticar; mas compreendi, sobretudo, que a caridade não deve ficar encerrada no fundo do coração: «Ninguém, disse Jesus, acende uma candeia para a colocar debaixo do alqueire, mas coloca-a sobre o candelabro para alumiar todos os que estão em casa». Creio que essa luz representa a caridade, que deve iluminar e alegrar, não só os que são mais queridos, mas todos aqueles que estão em casa, sem exceptuar ninguém.
(História de uma Alma, Ms C 12rº)
A Rainha do Céu
Sabemos muito bem que a Santíssima Virgem é a Rainha do Céu e da terra, mas ela é mais mãe do que rainha, e não se deve dizer, por causa dos seus privilégios, que ela eclipsa a glória dos santos todos, como o sol, ao surgir, faz desaparecer as estrelas. Meu Deus! que estranho! Uma Mãe que faz desaparecer a glória dos filhos! Eu, por mim, penso absolutamente o contrário; acredito que ela engrandecerá muito o esplendor dos eleitos.
Está certo falar dos seus privilégios, mas não se deve dizer apenas isso e se, num sermão, somos obrigados do princípio ao fim, a exclamar Ah! Ah!, já chega! Quem sabe se alguma alma não irá sentir até um certo afastamento em relação a uma criatura de tal maneira superior, e não pensará: «Se é assim, mais vale ir brilhar conforme se puder em qualquer outro cantinho!»
O que a Santíssima Virgem tem a mais do que nós, é que não podia pecar, estava isenta do pecado original; mas, por outro lado, teve muito menos sorte do que nós, porque não teve uma Santíssima Virgem para amar. É uma doce consolação a mais para nós, e a menos para ela!
(Últimos Conselhos, 21.VIII.3)
A Justiça de DEUS
Sei que é preciso ser muito puro para aparecer diante de Deus de toda a Santidade, mas também sei que o Senhor é infinitamente justo e esta justiça que assusta tantas almas é a razão da minha alegria e confiança. Ser justo, não é somente exercer a severidade para castigar os culpados, é também reconhecer as intenções rectas e recompensar a virtude. Espero tanto da justiça de Deus como da sua misericórdia. É porque é justo que «Ele é compassivo e cheio de doçura, lento para a ira e cheio de misericórdia. Porque conhece a nossa fragilidade, lembra-Se de que não somos senão barro. Como um pai sente ternura pelos filhos, assim o Senhor tem compaixão de nós» […]
Aqui tendes, meu Irmão, o que penso sobre a justiça de Deus, o meu caminho é todo de confiança e de amor, não compreendo as almas que têm medo de um Amigo tão terno. Às vezes quando leio certos tratados espirituais em que a perfeição é apresentada através de inúmeras dificuldades, rodeada por uma quantidade de ilusões, a minha pobre inteligência cansa-se muito depressa, fecho o sábio livro que me quebra a cabeça e me seca o coração e pego na Sagrada Escritura. Então tudo me parece luminoso, uma só palavra revela à minha alma horizontes infinitos, a perfeição parece-me fácil, vejo que basta reconhecer o próprio nada e abandonar-se como uma criança nos braços de Deus.
Deixando às almas grandes, às grandes inteligências, os belos livros que não posso compreender, e ainda menos pôr em prática, regozijo-me por ser pequenina visto que só as crianças e os que se assemelharem a elas serão admitidas ao banquete celestial. Sinto-me muito feliz por haver várias moradas no reino de Deus, porque se houvesse apenas aquela cuja descrição e caminho me parecem incompreensíveis, não poderia lá entrar.
(Carta 226, de 9.V.1897, ao P. Roulland)